Venha a este passeio por 523 anos de História do Brasil. Saiba mais sobre como o processo de escolha de representantes políticos pela sociedade brasileira avançou, por meio do combate às fraudes, da eleição de mulheres e da adoção de sistemas de votação mais transparentes, seguros e inclusivos.
Você sabia que a primeira prefeita eleita do Brasil foi a potiguar Alzira Soriano, em 1928, há quase 100 anos? E que, durante a ditadura militar (1964-1985), prefeitos das capitais dos estados eram nomeados por governadores, e não eleitos diretamente pelo povo? E, ainda, que a urna eletrônica foi adotada em 100% do território nacional nas Eleições Municipais de 2000?
Conheça agora 10 curiosidades sobre as eleições municipais brasileiras:
1 – Eleições das vilas: tradição portuguesa
Ao pisar em território americano, os colonizadores portugueses realizavam votações para eleger os que iriam governar as vilas e as cidades que fundavam, obedecendo à tradição portuguesa de escolher os administradores de seus povoados. Vários cargos eram preenchidos nesses pleitos, entre eles: vereador, juiz ordinário, procurador e outros oficiais.
A primeira eleição desse tipo de que se tem notícia no Brasil ocorreu em 1532 e definiu os membros do Conselho Municipal da Vila de São Vicente, atual São Paulo.
Mas quem podia votar? Só os ditos “homens bons” tinham o direito de escolher os administradores das vilas. Na época do Brasil Colônia, faziam parte desse grupo os nobres de linhagem, os senhores de engenho e os membros da alta burocracia militar.
2 – Primeira lei eleitoral da República
O tempo passou, e o Brasil declarou independência de Portugal em 1822. Até 1828, as eleições para os governos municipais obedeceram às chamadas Ordenações do Reino, que eram as determinações legais emanadas do rei e adotadas em todas as regiões sob o domínio de Portugal. No princípio, todo o povo votava; com o tempo, porém, passou a ser direito exclusivo de quem usufruía de maior poder aquisitivo, além do cumprimento de outras prerrogativas. A idade mínima para votar era 25 anos. Escravizados, mulheres, indígenas e assalariados não participavam.
Em 1889, o país tornou-se uma República. Em 1890, no início da chamada Primeira República (1889-1930), o chefe do governo provisório, marechal Deodoro da Fonseca, promulgou um regulamento eleitoral, o Decreto 200-A. O texto é considerado a primeira lei eleitoral da República e tratou unicamente da qualificação dos eleitores.
O Decreto n° 200-A promulgou o regulamento para a eleição do Congresso Nacional Constituinte, manteve o voto direto e determinou a inclusão de todos os eleitores já qualificados pela Lei Saraiva, que manteve o sistema de voto censitário da Constituição de 1824 e excluiu os analfabetos do sistema eleitoral.
A qualificação de outros eleitores, ao contrário do que previa a Lei Saraiva, não era feita pelas autoridades judiciárias, ficando sob a responsabilidade de comissões distritais, que iniciavam a elaboração das listas de eleitores, e de comissões municipais, que finalizavam a qualificação.
As comissões distritais eram formadas por um juiz de paz, um eleitor e o subdelegado da paróquia; as municipais, por um juiz municipal, o presidente da câmara de vereadores e o delegado de polícia. O eleitor insatisfeito com as decisões tomadas por essa comissão podia recorrer ao juiz de direito da comarca. Todos os que eram qualificados recebiam título de eleitor.
Essa estrutura dificultava a realização de eleições transparentes. Isso porque o processo de alistamento e qualificação de eleitores era de total responsabilidade das autoridades locais.
3 – Estados regulando eleições municipais
A Constituição de 1891 criou o sistema presidencialista, em que o presidente e o vice-presidente deveriam ser eleitos pelo sufrágio direto da nação, por maioria absoluta de votos. Além disso, atribuiu ao Congresso Nacional a competência de legislar sobre o processo eleitoral para os cargos federais em todo o país, deixando aos estados a responsabilidade de regulamentar as eleições estaduais e municipais. Em decorrência dessa autonomia, houve variação nas regras eleitorais entre os estados, consolidando-se, assim, a descentralização da dinâmica eleitoral.
As principais alterações promovidas pela primeira constituição republicana foram o fim do voto censitário e a continuidade do voto direto. O voto permaneceu restrito – analfabetos e mulheres não participavam do pleito –, e o processo eleitoral continuava permeado por toda sorte de fraudes.
4 – Primeira prefeita eleita
A primeira prefeita do país foi Alzira Soriano, eleita em 1928 para comandar o município de Lajes, no estado do Rio Grande do Norte, com 60% dos votos. Durante sua administração, ela promoveu a construção de estradas, mercados públicos municipais e a melhoria da iluminação pública. O jornal norte-americano The New York Times inclusive a citou, à época, como a primeira prefeita eleita em toda a América Latina. Com a Revolução de 1930, perdeu o mandato por não concordar com o governo de Getúlio Vargas.
A responsável pela indicação de Alzira como candidata à Prefeitura de Lajes foi a advogada feminista Bertha Lutz, uma das figuras pioneiras do feminismo no Brasil. O voto feminino no Brasil foi reconhecido em 1932, pelo Código Eleitoral, e incorporado à Constituição de 1934, mas era facultativo. Em 1965, tornou-se obrigatório.
No discurso de posse, Alzira Soriano foi profética. “Determinaram acontecimentos sociais do nosso querido Rio Grande do Norte, na sua constante evolução da democracia, que a mulher, esta doce colaboradora do lar, se voltasse também para colaborar com outra feição na sua obra político-administrativa. De outro modo não poderia ser. As conquistas atuais, a evolução que ora se opera, abre uma clareira no convencionalismo, fazendo ressurgir nova faceta dos sagrados direitos da mulher”. Posteriormente, ela cumpriria três mandatos como vereadora.
5 – Código Eleitoral de 1932: marco na democracia
A chegada do Código Eleitoral de 1932 mudou a história da democracia no Brasil. Regulou em todo país as eleições federais, estaduais e municipais; criou a Justiça Eleitoral, uma Justiça especializada para cuidar das eleições; estabeleceu o voto secreto e o voto feminino facultativo; adotou o sistema de representação proporcional; e o início do voto obrigatório para homens com menos de 60 anos.
O Código ajudou a eliminar as fraudes que ocorriam nas eleições desde a Primeira República e trouxe também dispositivos de segurança: o título eleitoral previsto no regulamento daquele ano, por exemplo, foi o primeiro a ter a fotografia e a impressão digital do eleitor.
6 – Prefeitos das capitais nomeados
O Ato Institucional n° 3, de 5 de fevereiro de 1966, emitido durante a ditadura militar (1964-1985), estabeleceu que os governadores fossem eleitos indiretamente pelas assembleias legislativas estaduais e que eles nomeassem os prefeitos das capitais, após aprovação das respectivas casas legislativas. Os prefeitos seriam eleitos diretamente apenas nas cidades que não fossem capitais e nas cidades que não fossem consideradas de segurança nacional.
Para conhecer a cronologia eleitoral no período, acesse aqui e clique em Cronologia das eleições.
7 – Pacote de Abril
A Emenda Constitucional nº 11, chamada de Pacote de Abril, envolveu um conjunto de medidas baixadas em abril de 1977, depois de o presidente Ernesto Geisel ter fechado o Congresso Nacional por não ter conseguido aprovar alterações constitucionais. Entre elas, estava a criação do senador biônico, com objetivo de impedir que o MDB conseguisse ter maioria no Senado. Os senadores biônicos foram eleitos indiretamente por um colégio eleitoral composto de forma a dificultar a vitória da oposição.
O texto também estendeu as restrições da Lei Falcão às eleições para os legislativos municipal e estadual. A Lei Falcão (Lei n° 6.339/1976) barrou o acesso dos candidatos em rádio e televisão. Os partidos só poderiam apresentar o nome, o número, o currículo dos candidatos e uma fotografia, no caso da TV.
8 – Redemocratização em 1988
Outro marco nesse processo de evolução foi a unificação do Cadastro Eleitoral em 1985, início da informatização do processo eleitoral. Daí em diante, houve um aumento crescente na capacidade de combater erros não intencionais e fraudes.
A Constituição de 1988 determinou que o presidente da República e os governadores, bem como os prefeitos dos municípios com mais de 200 mil eleitores, fossem eleitos por metade mais um dos votos válidos (maioria absoluta) ou em dois turnos, se nenhum candidato alcançasse a maioria absoluta na primeira votação. Nos municípios com menos de 200 mil eleitores, os chefes do Executivo seriam eleitos, em turno único, por maioria simples.
A Carta de 1988 fixou, ainda, a desincompatibilização até seis meses antes do pleito para os chefes do Executivo (Federal, Estadual ou Municipal) que quisessem concorrer a outros cargos. Conhecida como Constituição Cidadã, permitiu o voto da pessoa analfabeta, diminuiu a idade mínima da faculdade do voto para 16 anos, ampliou os poderes do Congresso Nacional e também garantiu novos direitos sindicais. A Emenda Constitucional n° 16, de 4 de junho de 1997, possibilitou a reeleição para os cargos de prefeito, governador e presidente.
9 – Urna eletrônica
Nas Eleições Municipais de 1996, iniciou-se a implementação do voto eletrônico no país: os votos de mais de 32 milhões de brasileiros – um terço do eleitorado da época – foram coletados por cerca de 70 mil urnas eletrônicas. A primeira votação utilizando as urnas eletrônicas aconteceu em 6 de outubro de 1996. O equipamento esteve em 26 capitais e 31 municípios do interior.
Já as Eleições Municipais de 2000 marcaram o primeiro pleito 100% informatizado do país. Terminava de vez a votação por cédulas de papel no Brasil. Ao todo, 353.780 urnas eletrônicas foram usadas pelo eleitorado apto a votar naquela época, um total de 109.780.071 eleitoras e eleitores.
10 – Biometria
A biometria foi mais um passo na evolução da identificação do eleitor. Nas Eleições Municipais de 2008, a Justiça Eleitoral utilizou pela primeira vez as impressões digitais para identificar biometricamente o eleitorado nos municípios de São João Batista (SC), Fátima do Sul (MS) e Colorado do Oeste (RO).
Com o sucesso do projeto, em 2010, foi ampliado, em alguns municípios, o uso de urnas com aparelho de identificação biométrica. Nas Eleições Gerais daquele ano, mais de 1 milhão de eleitores de 60 municípios de 23 estados votaram após a identificação pela biometria. E, assim, a Justiça Eleitoral seguiu aumentando esse número. No pleito de 2018, o total de eleitoras e eleitores cadastrados biometricamente já passava de 85 milhões. Hoje, segundo o site da biometria da Justiça Eleitoral, 126,2 milhões de eleitoras e eleitores estão com a biometria cadastrada.
A coleta da biometria é um serviço eleitoral obrigatório e gratuito, realizado apenas em atendimento presencial. A identificação biométrica torna o processo eleitoral mais seguro. É um dos elementos que compõem a base de dados da Identificação Civil Nacional (ICN), programa criado para identificar brasileiras e brasileiros em suas relações com o Estado, provendo segurança e facilidade na utilização de serviços de identificação.
Imagem: TSE